segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Do Caio...

Embora eu costumasse dizer que não era bom, absorvia vibrações, todas as vibrações, as energias. Boas, más, todas. Então a boca pintada de vermelho forte vivo ressaltava ainda mais. Qualquer coisa vermelho vivo, a boca, entre o preto do vestido e o branco da pele.

Ele tornou a encher o cálice.

— Você gostava dela?
— O que é coisa, gostar?
—Você sabe.
— Acho que sim. Embora não parecesse. Tanto, tanto tempo.

Bebi mais. Que não tinha importância. Gostar, o passado, a moça, os pés. Eu não podia ter memórias. Acho que disse isso em voz alta. Ou não era preciso, porque ele falou:

— Por que não ter memórias?

Os buracos negros, eu quis dizer. Mas fiquei quieto, desejando apenas ter um disco qualquer de cítara tocando para que nesse momento pudéssemos interromper a conversa para prestar atenção num acorde qualquer entre duas cordas, mais um silêncio que um som. Sempre podíamos ouvir a chuva, seu bater compassado na vidraça.
 
 
Caio F.

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